domingo, 9 de dezembro de 2012

NINGUEM PODE VIVER ISOLADO



Aristóteles fundamenta a tese que “o homem é um animal social” dizendo que a união entre os homens é natural, porque o homem é um ser naturalmente carente, que necessita de coisas e de outras pessoas para alcançar a sua plenitude. Aristóteles afirma:


“As primeiras uniões entre pessoas, oriundas de uma necessidade natural, são aquelas entre seres incapazes de existir um sem o outro, ou seja, a união da mulher e do homem para perpetuação da espécie (isto não é resultado de uma escolha, mas nas criaturas humanas, tal como no outros animais e nas plantas, há um impulso natural no sentido de querer deixar depois de individuo um outro ser da mesma espécie).” (Política, I, 1252a e 1252b, 13-4)


Aristóteles faz a diferenciação entre dois tipos de espécies, as gregárias (koinonia), e as solitárias (monadika), sendo que o homem faz parte das duas espécies. As duas espécies são passiveis de uma nova divisão, aquelas que são propensas há uma vida sociável (politika) e aquelas que vivem de maneira esparsa (sporadika). O homem faz parte do primeiro grupo (politika). Portanto, a sociabilidade faz parte da natureza humana. Segundo Aristóteles:

“a cidade é uma criação natural, e que o homem é por natureza uma animal social, e que é por natureza e não por mero acidente, não fizesse parte de cidade alguma, seria desprezível ou estaria acima da humanidade [...] Agora é evidente que o homem, muito mais que a abelha ou outro animal gregário, é um animal social. Como costumamos dizer, a natureza não faz nada sem um propósito, e o homem é o único entre os animais que tem o dom da fala. Na verdade, a simples voz pode indicar a dor e o prazer, os outros animais a possuem (sua natureza foi desenvolvida somente até o ponto de ter sensações do que é doloroso ou agradável e externá-las entre si), mas a fala tem a finalidade de indicar o conveniente e o nocivo, e portanto também o justo e o injusto; a característica especifica do homem em comparação com os outros animais é que somente ele tem o sentimento do bem e do mal, do justo e do injusto e de outras qualidades morais, e é a comunidade de seres com tal sentimento que constitui a família e a cidade.” (Política, I, 1253b, 15)

Assim, “a natureza social do homem se manifesta na linguagem, no dizer ou no logos [...] O homem é o único animal que fala, e o falar é função social” (MARÍAS 2004, 91). Assim em sociedade, o homem poderá realizar a sua potencia mais elevada – vida política (politikon).

Pensando na definição de Aristóteles, posso dizer que o homem enquanto ser social partilha de uma herança genética que o define como ser humano.  A nossa estrutura cerebral permite-nos desenvolver a linguagem e interpretar os estímulos provenientes do meio.  É na capacidade de o ser humano se adaptar ao meio e de transmitir ás gerações seguintes as suas conquistas, é na sua capacidade de aprender que reside a linha que distingue o ser humano do animal. O homem só se realiza como Pessoa na relação com os outros, relação essa que tem vários níveis e assume múltiplas formas: universalidade; sociabilidade e intimidade.  Ao nível da intimidade a pessoa encara-se como um ser dotado de uma consciencia de si, baseada na racionalidade e nas emoções que, embora seja individual e interior, só se constroi com base em relações significativas com outros seres humanos... Ao nível da sociabilidade a pessoa encontra-se como membro de uma sociedade organizada, necessitando de passar por um longo processo de socialização até que  possa assumir-se como um membro ativo da sociedade a que pertence. Não se pode dizer que a sociedade é uma mera soma de individuos, uma vez que cada individuo é, em si mesmo, um produto da cultura da sociedade a que pertence.

Sendo assim, podemos dizer que ninguém gosta de viver só, vivemos em busca de um ideal de felicidade que só pode ser encontrado na coletividade, por exemplo: como podemos ser felizes se não podemos compartilhar a felicidade com outras pessoas? Possuem-se bens materiais de grande valor para quem vou mostrar? Todos tem necessidade da companhia de outras pessoas. Podemos, por algum tempo viver isolados, mas não por muito tempo. Por isso como Aristóteles define, viver em sociedade constitui uma característica fundamental da pessoa humana. Já na idade da pedra, os homens se reuniam para caçar e descobrir um modo de sobreviver. Podemos observar que o homem em grupo pode se organizar e se fortalecer para enfrentar as vicissitudes da vida, percebe-se que o homem não viveria por muito tempo de forma isolada.

O escritor italiano Umberto Paolo Quintavalle é autor de um conto intitulado “As Quatro Drogas de Robinson Crusoé”. O personagem desse conto tem uma grande tendência para viver isolado. Naufrago, passa a viver numa ilha de fauna e vegetação abundantes, mas não habitada pelo homem. Goza de algum conforto: alimentação farta e quase nenhum trabalho. Mas seus únicos companheiros são pequenos macacos e cabras afáveis. Quando já velho, pressente a morte e lamenta: “Preferiria a miséria, a falta de bens materiais, desde que tivesse comigo um único ser humano. Não precisaria toca-lo: já me bastaria vê-lo. Hoje sei que a solidão é horrível. Não existe miséria pior que estar só”.